por Davi M. Simões
Escrupulosamente, sempre que escrevo, objetivo falar muito bem de Nosso
Senhor e Sua Esposa, a Igreja. Tento, dadas as minhas limitações (intelectuais,
culturais e estilísticas), honrar a Tradição. Se já escrevi algo inaceitável à
Doutrina de Cristo foi antes por ignorância que má intenção, e estou disposto a
me retratar prontamente.
Aqui me encontro, novamente, em defesa da Fé. Fiquei sabendo que a seita
de “metaleiros doidões”, a Nova Resistência, escolheu São Jorge como padroeiro.
Ora, como um grupo abertamente pagão, que exalta cultos afro-brasileiros e
inclusive regimes islâmicos, pode escolher um santo martirizado por bradar
justamente que todos os deuses dos pagãos são demônios?
São Jorge foi um cavaleiro romano da região da Capadócia, hoje Turquia,
do século III. Nasceu de família piedosa e cristã. Em plena época de
perseguição romana aos católicos invadiu a corte do imperador Diocleciano e o
repreendeu pelo culto aos falsos deuses.
“Os santos nunca hesitaram em depredar os ídolos, destruir os seus templos,
fazer legislar contra as práticas pagãs ou heréticas. A Igreja – sem nunca
forçar a crer ou receber o batismo – sempre se recomendou o direito e o dever
de proteger a Fé de seus filhos, e impedir, quando podia, o exercício público e
a propaganda dos falsos cultos.” (Pe. Matthias Gaudron).
O santo guerreiro foi um soldado valoroso e destacado. Um dia doou todos
os seus bens aos pobres, trocou a armadura por uma roupa modesta e começou a
admoestar corajosamente os idólatras. Dizia, como está nos manuscritos
cópticos: “Tornar-me-ei um soldado do Senhor Jesus Cristo, o Rei dos
Céus”. Mas foi precisamente o seu martírio, que converteu
massivamente. Foi torturado por dias a fio, de formas inimagináveis. Colocaram
sal em suas chagas e no fim, dia 23 de abril, tiveram que decapitá-lo, pois ele
não negou sua fé. Até estendeu seu pescoço com alegria. A esposa do imperador
se converteu e o torturador também.
Disse Nosso Senhor: “E quanto àqueles meus inimigos que não
quiseram que eu reinasse sobre eles, trazei-os aqui, e matai-os diante de mim.”
(Lucas 19,27). Ser um soldado do Rei dos Céus, como foi São Jorge, é
entender que Sua realeza não se restringe apenas aos batizados. Como sustenta
Leão XIII: “Seu império [de Cristo] não se restringe
apenas, exclusivamente, às nações católicas, nem somente aos cristãos batizados
(...): abrange, igualmente, sem exceção, todos os homens, mesmo estranhos à Fé
Cristã, de sorte que o império de Cristo Jesus é, em estrita verdade, a
universalidade do gênero humano.”
No “Catecismo
Católico da Crise na Igreja” o Pe. Matthias Gaudron explica por que honrar a
Deus publicamente. A sociedade temporal deve necessariamente se submeter à
Religião Católica: “Jesus Cristo – que é o único Mediador entre os
homens e Deus – nunca é facultativo. E a Igreja Católica, que é a única Igreja
de Cristo, muito menos.
Leão XIII ensina:
‘Honrando a divindade, as sociedades políticas devem seguir estritamente as
regras e o modo segundo os quais Deus, ele mesmo, declarou querer ser
honrado’.”
Para o Pe. Gaudron a Igreja e o estado, embora sendo duas
sociedades distintas, não só não devem estar separados, “mas sua
estrita separação é absurda e antinatural. O homem não está dividido em um
cristão e um cidadão. Ele não deve ser cristão apenas em sua vida privada, mas
em todos os domínios de sua vida. Deve, portanto, empreender uma política
cristã, esforçando-se por colocar em acordo as leis civis com as leis
divinas.”
E mais à frente, continua: “Quando uma população é
majoritariamente católica, o catolicismo deve ser a Religião do Estado. (...)
As falsas religiões são um mal contra o qual o Estado católico deve proteger
seus cidadãos. Deve, pois, proibir ou limitar tanto quanto possível o exercício
público e a propaganda dos falsos cultos.”
Escreveu São Pio X, na Vehementer nos: “Que seja
preciso separar a Igreja do Estado é uma tese absolutamente falsa, um
perniciosíssimo erro. Baseada, com efeito, sobre aquele princípio de que o
Estado não deve reconhecer nenhum culto religioso, é gravemente injuriosa a
Deus; pois o Criador do homem é também o fundador das sociedades humanas, e Ele
as conserva na existência assim como nos sustenta nela. Nós Lhe devemos,
portanto, não apenas um culto privado, mas um culto público e social para O
honrar. Além disso, aquela tese é a negação muito clara da ordem sobrenatural.
Ela limita, com efeito, a ação do Estado à mera busca da prosperidade pública
durante esta vida (...).”
Como pode São Jorge ser padroeiro de pagãos adoradores do falo e
defensores de aiatolás? A devoção ao santo veio para o Ocidente trazida pelos
cruzados. Ele, em espírito, apareceu na primeira cruzada, instigando os
soldados a avançarem contra os infiéis, e simultaneamente na Reconquista, no
milagre da Batalha de Alcoraz. Assim retrata uma crônica da época: (...)
Invocando o Rei [Sancho Ramírez, rei de Aragão] o auxílio de
Deus Nosso Senhor, apareceu o glorioso cavaleiro e mártir São Jorge, com armas
brancas e resplandecentes, sobre um muito poderoso cavalo ajaezado com
paramentos prateados. Ele trazia um cavaleiro na garupa, e ambos com cruzes
vermelhas nos peitos e escudos, divisa de todos os que naquele tempo defendiam
e conquistavam a Terra Santa, e que agora é a Cruz e o hábito dos cavaleiros de
Montesa. E fazendo o sinal ao cavaleiro que vinha na anca para que apeasse,
começaram a combater os dois de modo tão forte e denodado contra os Mouros, de
davam-lhes golpes tão mortais, um lutando a pé e o outro no cavalo, que abriam
clareiras por onde quer que iam, e reuniam e acaudilhavam os Cristãos. O
cavaleiro que trouxe o Santo Mártir São Jorge, diz a história de São João de la
Peña alegada por Zurita, era alemão, e naquele dia e hora pelejava em Antioquia
junto com os demais cruzados. Mas os Mouros abateram seu cavalo e rodearam-no
para matá-lo; neste momento, apareceu o glorioso São Jorge, sem que o bom
cavaleiro alemão entendesse nem soubesse quem era... e ajudou-o a subir na
garupa do cavalo, e o tirou da batalha, e instantaneamente transportou-o para
Aragão, ao local onde se dava a batalha do rei com os Mouros, então lhe fez
sinal que apeasse e pelejasse (...) Espantaram-se os inimigos da fé vendo
aqueles dois cavaleiros cruzados, um a pé e outro no cavalo. E como Deus os
perseguia, começaram a fugir a ver quem mais podia. Pelo contrário, os cristãos,
embora ficassem maravilhados vendo o novo estandarte da Cruz, alegraram-se, e
redobraram seus esforços ferindo os Mouros: e assim os enxotaram do campo e
acabaram vencendo.”
Nada sai da alçada da NR, e a ela tudo diz respeito. Ela é hispanista e indigenista
ao mesmo tempo. É “ortodoxa” e espírita. É islâmica e hindu. É tudo aquilo em
que se pode tirar um caráter esotérico. O tal do “catolicismo popular” que
prega, é simplesmente o milenarismo mais delirante (algo que um novo Antônio
das Mortes solucionaria) condenado pela Igreja, desde Joaquim de Fiori no
século XII. Ela também é distributista (sem seus membros nunca terem lido G.K.
Chesterton) e brizolista, ou seja: pari passu com a Doutrina
Social da Igreja, clama pela luta de classes (?). É um grupo absolutamente
insignificante politicamente, que não seria conhecido se o Aleksandr Dugin (de
quem são tirados seus fundamentos filosóficos, políticos e geopolíticos) não
tivesse polemizado com o Olavo de Carvalho (*) (debate em que ele conseguiu perder
do velho gagá). Todo o argumento duginiano se resumiu a isto: “o liberalismo é
o mal absoluto; tudo o mais é aceitável, irrestritamente”.
O grande inspirador dos neo-pagãos e neo-gnósticos dessa cepa é o
amoralista F. Nietzsche. No “Ortodoxia” G. K. Chesterton compara o “filósofo”
(em verdade, entendo o alemão mais como poeta) com Joana d’Arc, dizendo que ele
elogiava os guerreiros, bravos e corajosos, enquanto a donzela de Orléans era
tudo aquilo. “Ela não se limitou a admirar a luta, mas soube, também,
lutar. Ela não temia um exército, enquanto ele, ao que parece, tinha medo de
uma vaca.” Afirma ainda que o amante da “vontade de potência” morreu
impotente e demente em uma cadeira de rodas. E sagazmente observa o erudito
inglês: “Nietzsche sugere-nos que pairemos acima das bestas, abolindo a
única coisa que nos coloca acima delas: o sentido de pecado.”
Minha preocupação não é outra senão com os católicos (que efetivamente
nem devem existir entre eles, embora tanto tentem aproximação. Se existem são
bergoglianos ou da “teologia” da libertação), de serem seduzidos pelo Rasputin
do Putin. Nada mais nobre que um assaltante (**) pode sair de um movimento
revolucionário, moralmente relativista. O repúdio do bruxo russo ao catolicismo
não é só tácito, mas foi claramente expresso em uma entrevista: "O catolicismo não pode ser uma garantia de
defesa contra a Nova Ordem Mundial, porque é um estágio de transição para essa
ordem (...). A Polônia está em uma situação geopolítica trágica. Ambos – isto
é, a Nova Ordem Mundial e nós eurasianos – queremos privá-la do seu catolicismo
(...). É necessário derrubar o Catolicismo por dentro, fortalecer a maçonaria
polonesa e os movimentos laicistas decentes, promover o cristianismo heterodoxo
e anti-Papa" (***). Aqui
ele deixa bem claras suas pretensões nacionalistas e imperialistas contra o
Ocidente e particularmente a Polônia!
Que os membros da NR não se metam no que não entendem, com sua nojenta
soberba luciferiana. Que cultuem Kali, Maomé, Mishima (um gay suicida)
ou o Senhor Dugin (libertador Todo-poderoso, Lúcifer encarnado, que desceu do
Seu trono venusiano para destruir o Demiurgo), mas deixem São Jorge em paz!
_
(*) Link para quem se interessar em ler o debate entre o Olavo e o
Dugin: https://www.pdfdrive.com/os-eua-e-a-nova-ordem-mundial-um-debate-entre-olavo-de-carvalho-e-alexandre-dugin-e175944798.html
(**) O fundador da NR Fortaleza e seu irmão (autodenominados “carecas do
Ceará”) foram presos em flagrante, no dia 1 de junho de 2020, assaltando uma
farmácia: https://www.facebook.com/portalitaocanews/videos/um-novo-v%C3%ADdeo-mostra-de-outro-%C3%A2ngulo-a-a%C3%A7%C3%A3o-r%C3%A1pida-de-um-inspetor-de-pol%C3%ADcia-c%C3%ADv/1103779843331122/?__so__=permalink&__rv__=related_videos
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(***) Entrevista à Grzegorz Górny,
publicada na revista Fronda, nº 11-12, janeiro-junho/1998, pp. 130-146.